sexta-feira, outubro 29, 2004

Alternativa

É muito tempo.
A natureza do poder é perversa; por definição vicia e corrompe.
Eis a razão da existência da democracia: alternância do poder.
Quando assistimos a situações de manutenção de determinadas personalidades no desempenho de funções de poder ao longo de décadas, tal só pode acontecer porque a democracia tem problemas. E os problemas da democracia resolvem-se com mais democracia.
A democracia só pode ser praticada por pessoas inteligentes e de grande capacidade de gestão de sensibilidades e emoções, dadas as suas exigências em matéria de coordenação, participação, delegação, conciliação, negociação, etc..
Quando o poder se prepetua é porque a democracia está doente ao ponto de o deixar de ser. E constroi-se um ambiente propício à manutenção do status quo e das clientelas que suportam o detentor do poder.
Eis o ambiente dos medíocres. Aos medíocres não interessa a democracia porque é muito trabalhosa. Interessa-lhes a ditadura que é muito mais facilitadora.
Mas como resolver o problema quando a democracia permite ambientes de mediocridade propícios à manutenção ad eternum de determinadas pessoas no poder, à custa de clientelas e controlo do eleitorado?
Limitar o número de mandatos de exercício de funções de poder é uma das soluções. A outra é a assunção por parte dos partidos e similares opositores às situações de que só devem escolher os melhores e com melhor perfil para cada uma das funções. Mais do que aos clientes internos, as diferentes associações políticas devem satisfazer os clientes externos. É desta simbiose de interesses que aquelas podem obter sucesso numa corrida eleitoral com o objectivo de mudança de ambientes que acabaram por se tornarem perversos porque corroídos pelo desgaste da viciação.
O concelho de Beja é um case study paradigmático. À alternativa (única) cabe a responsabilidade soberana de apresentar a solução para a mudança e, concomitantemente, a solução de mudança. Rapidamente. Com clareza, aberta e franca, sobretudo com carácter.
A credibilidade das alternativas é muito importante na arquitectura do caminho para a mudança, mesmo sabendo-se que o poder não se conquista. Na realidade, o poder perde-se.
Por isso, deve ser exercido com humildade, embora com determinação quanto baste.
E só as pessoas inteligentes são humildes.
Abra-se o concurso para o recrutamento e selecção do candidato ideal.

sexta-feira, outubro 22, 2004

Maio em Outubro

Grande filme!
Os homens desempenharam o papel com toda a estética e determinação no acto. O cidadão suspeito, de elevado índice de perigosidade, estrutura física atlética, munido das mais perigosas armas, é eficazmente retirado da multidão, prostrado no chão, esmagado pelo joelho de um policial de intervenção e imobilizado por outro para que o acto de colocação de algemas fosse perfeito, apesar de ter demorado entre 3 a 4 minutos.
Este poderia ser o excerto do texto do roteiro de uma novela de ficção televisiva, alusiva aos acontecimentos estudantis de Coimbra, não fosse o actor principal um jovem caloiro de comunicação social, de 19 anos, franzino, pacato, que não resistiu um nanosegundo aos actos policiais e a quem foi aplicada a medida de constrangimento ( e eles a darem-lhe em chamar coacção!) de apresentação quinzenal na esquadra de polícia da área de residência, apenas por usar de direitos constitucionais: o de se rebelar e o de se manifestar livremente.
A ousadia, a coragem e determinação demonstrada pelos profissionais de polícia envolvidos sobre a cobaia provam que estão aptos a enfrentar delinquentes perigosos sem que aqueles possam pestanejar. Há que os colocar a fazer serviço rapidamente, já que as estatísticas apontam para um incremento da criminalidade violenta.
A meu ver não será muito razoável que passem a utilizar rotineiramente o método de aplicação do treino em prática simulada sobre populações estudantis de meios académicos com tradição de luta (como é o caso de Coimbra) pois os estudantes conhecem a história e lêem-na, adaptando-a em cada momento às circunstãncias. E até hoje (e recuemos apenas até Maio de 68) nunca nenhum Estado ganhou aos estudantes, nem a prepotência vingou sobre a razão e a liberdade. É tudo uma questão de tempo.

segunda-feira, outubro 18, 2004

Lentidão

As incursões de elementos do Governo da República na campanha eleitoral da Região Autónoma dos Açores acabaram por se pautar pelo desnorte e polichinelo.
Exemplo disso é o caso do jantar comício realizado em Lagoa - Açores, pela coligação PSD / CDS onde, a dado passo de uma intervenção, com alusão a anedotas de alentejanos, alguém as utilizou para dizer que o Governo Regional era "mais lento" do que os alentejanos.
O protagonista da associação do caso de semelhante gafe ao de Carlos Borrego - que se demitiu justamente por causa de uma piada - foi o Ministro Nuno Morais Sarmento.
Não interessa o contexto, não interessa o motivo. O que interessa é o que foi dito e por quem foi dito.
O Sr. Ministro será daquelas pessoas que não pode recorrer à autoridade de princípios que regem as normas de comportamento social aceitável para arremessar pedras aos telhados dos outros. E muito menos para associar a classificação de lentos ou mais lentos do que a quem quer que seja.
Estou perfeitamente à-vontade para criticar este deslize linguístico. Não sou alentejano; sou alfacinha de gema (terceira geração) mas vivo e trabalho em Beja há 15 anos, onde fui bem aceite e me honro de contar nas minhas relações com figuras públicas de relevo de todos os quadrantes políticos, intelectuais e religiosos, bem como de cidadãos anónimos, muitos dos quais me orgulho de ter como amigos.
O Sr. Ministro Morais Sarmento, ao subscrever o apelido de lentos os alentejanos, chamou lenta à sua colega Ministra da Ciência e Ensino Superior que é natural de Beja; chamou lento ao Sr. Governador Civil de Beja e seus colaboradores de gabinete, a dois elementos do Conselho de Administração da EDAB e demais colaboradores daquela Organização, todos do PSD; chamou lentos aos membros do Conselho de Administração da EDIA e demais colaboradores, naturais da região e membros do PSD; chamou lentos a todos os nomeados políticos do PSD que desempenham cargos de relevo em todo o Alentejo; chamou lentos aos políticos alentejanos do PSD; chamou lentos aos empresários prosélitos do PSD que têm iniciativas económicas de sucesso e que colaboram com donativos para as campanhas eleitorais do seu partido; chamou lentos aos habitantes de uma das regiões mais votadas ao esquecimento pelos poderes centralizadores da responsabilidade do PSD; chamou lenta à CCDRA e disse que os Açoreanos eram ainda mais lentos.
Claro que o Presidente do Governo Regional dos Açores - agora reeleito - pediu de imediato a sua demissão. E a comunicação social não fez eco de tamanha argolada política. Tínhamos o caso de Estado do encontro SLB / FCP.
Mas eu reforço: o Sr Ministro Morais Sarmento posicionou-se no mesmo lugar da grelha de partida do Engº. Carlos Borrego, à época Ministro de Cavaco Silva. A credibilidade que eventualmente o consolidava no exercício de funções de serviço público está abalada e, consequentemente, deve tirar as ilações decorrentes.

segunda-feira, outubro 11, 2004

Ruralbeja

Ou Beja Rural. Tanto faz. O concelho tem uma cultura tipicamente rural e contra isso, só as gerações vindoras podem modificá-la emprestando-lhe mais urbanidade, mais civilidade, mais cosmopoliticidade.
A feira esteve razoável. Opino ter-se tratado de uma boa iniciativa para a implementação de um calendário de eventos de animação do PFEB (parque de feiras e exposições de Beja) que mantenha o espaço ocupado ao longo do ano.
Evidentemente que ninguém está à espera de enchentes como na Ovibeja. Mas é preciso rentabilizar o espaço e evitar os ataques vergonhosos ao património, prepertrados por pequenos grupos de delinquentes que agem à sombra da falta de vigilância permanente.
E é preciso controlar acessos e levar aos calaboços da PSP esses rapazinhos que se masturbam a curtir a ressaca do álcool e das sintéticas, destruindo bocas de incêndio, casas de banho, portas, candeeiros implantados no solo (cujos vidros só com marreta se podem partir), etc.. Se necessário, os papás também podem ir com eles.
Perderam a capacidade de disfrutar as coisas boas da vida; perderam as referências; perderam o sentido de orientação; de selecção entre o que é bom e o que é mau; buscam, cada vez mais e cada vez mais cedo, emoções fortes; qando não se matam e não matam os outros em acidentes brutais de viação, destróiem o que encontram à frente para afirmação de uma personalidade doente, disfuncional e gratuita, em opção àquilo que o comum dos mamíferos faz: marcar o território. Só que as outras espécies marcam o território segundo regras bem definidas e identificam-se indelevelmente. Estes Sapiens Sapiens fazem-no anonimamente. Cobardes.
Mas o espectáculo de Sábado com Pedro Abrunhosa foi excelente. Tenho pena que o espaço - bem composto - não tivesse mais gente. Seguramente que não existe outra oportunidade de assistir a outro igual, em qualquer ponto do país, por apenas € 2,50.
à organização, os meus parabéns e força anímica para ultrapassarem desentendimentos e ganhar coragem para vôos mais altos.
Aos empresários da região, empresas públicas, sociedades anónimas de capitais públicos e privados, uma apelo ao altruísmo para que participem como mecenas ou patrocinadores de espectáculos dirigidos às massas, sejam os designados clássicos ou ligeiros.
O Parque merece; a cidade merece.
Apesar de tudo.

quinta-feira, outubro 07, 2004

Lápis azul

Não consigo resistir ao impulso de falar do tema do dia. Não se tratando propriamente de uma matéria de debate político regional ou de desenvolvimento local, de forma directa, acaba por sê-lo por afectação lateral.
Tinha 19 anos quando se deu o 25 de Abril. Recordo-me perfeitamente do ambiente que se vivia com a censura prévia e mordaça à liberdade de expressão.
Trinta anos volvidos repetem-se alguns cenários que já tiveram eco durante os governos chefiados por Aníbal Cavaco Silva. Porém, agora com outros contornos e requintes que raiam postulados transcritos por Maquiavel.
As escutas telefónicas, a devassa do correio electrónico, o uso e abuso do telemóvel para localizar pessoas, a via verde para saber da vida de cada um de nós, o cartão Visa para descobrir os amantes, a conta bancária para ver que quotas se pagam e a quem, o SIS, a nova entidade de inteligência de nível superior ao SIS para combater o terrorismo, e por aí fora, são apenas pequenos indícios do que se passa em matéria de controlo da liberdade individual consagrada no Texto Fundamental da República.
Embora se não saiba, ao certo, o que está por detrás da saída de Rebelo de Sousa da TVI - o que se tem visto até agora são snipers a atirar a matar - não deixa de ser preocupante o facto de estarmos perante uma situação inédita. Não há muito tempo, a designada Alta Autoridade Para a Comunicação Social protagonizou o fim do debate em sede de noticiário alargado de Domingo do canal 1 da RTP, com a argumrentação de falta de pluralidade.
A SIC aproveitou o vazio e criou espaços de debate político com participações individuais que vieram a não se consolidar no tempo, não se sabe bem porquê.
Agora a TVI despede MRS e Miguel Sousa Tavares admite sair.
Estas questões merecem um olhar atento do mais alto magistrado da Nação, subsidiariamente do Tribunal Constitucional e, sobretudo, definir-se quem é quem, quem controla o quê e que poderes existem neste país que podem mais do que o poder institucionalizado por mandato político e democrático.
Já não é a Capela do Rato, a Maçonaria, a Opus Dei e muito menos a Carbonária. Estes já não têm segredos. São outros bem mais requintados que ultrapassam o poder financeiro e que fazem gato-sapato dos políticos.
Cada vez vejo mais riscos azuis à minha frente e não consigo descobrir o dono do lápis.

sábado, outubro 02, 2004

Desnivelado

É como está o pavimento novo da estrada da Salvada.
Fiz o percurso que já está circulável e constatei - nos dois sentidos - que o tapete está com sérios problemas de nivelamento e com bermas perigosíssimas. Mais perigosas do que estavam com o traçado velho.
Tem agora uma reta - convidativa a velocidades excessivas - com abatimentos dos lados, completamente injustificáveis, tratando-se de um tapete novo. Dá a sensação que já está em utilização há anos e que os pesados circulam por lá às centenas.
Declaradamente, o acompanhamento da obra não foi feito.
Para além disso, essas zonas de abatimento (significativo) coincidem com locais onde existem autênticas "ravinas" sem "rails" de protecção.
Importa referir que a estrada, para ter duas faixas de circulação de largura aceitável, não tem escapatórias laterais. Daí a importância da instalação de "rails" nos locais onde o perfil, em relação ao solo, está num nível bastante mais elevado.
Numa situação de emergência, as viaturas podem despistar-se e sair da estrada em autêntico vôo.
É suposto que a obra que foi tão desejada e esteve no centro de várias polémicas, venha contribuir para o aumento da segurança de quem nela circula e não o contrário.
Ainda vamos a tempo de corrigir os erros nesta fase e antes de começarem a ser pintados os traços na via.
Já agora, não se percebe muito bem como foram decididos os percursos alternativos para a segunda fase, uma vez que uma parte importante do troço está transitável. E também não se entende porque se optou por "empurrar" os automobilistas para caminhos onde só se deve circular em bicicleta "cross country".
O dono-da-obra tem de ir mais ao terreno.